A reforma tributária pode ser a mudança mais estrutural na economia brasileira desde o Plano Real, se bem elaborada. A conclusão é do relatório de avaliação da Proposta de Emenda à Constituição 45/2019, publicado pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Segundo o estudo, os impactos da reforma devem ser positivos para todos os setores econômicos, porém, em intensidades diferentes. O relatório aponta ainda o cashback — mecanismo previsto na proposta para devolver parte dos impostos arrecadados às famílias de baixa renda — como a solução mais efetiva para a população em situação de pobreza.
Entre outros pontos, o estudo mostra que as reduções de alíquotas sobre consumo “não são efetivas como políticas públicas, seja sob o aspecto econômico, seja pela ótica social.” Já que, segundo o documento, o contribuinte final não recebe parte do benefício fiscal. O TCU defende que as exceções — voltadas para setores com isenção ou redução de tributos — devem ser submetidas a avaliações anuais de custo-benefício entre 2026 e 2033: “que sejam previstas as condições necessárias para que o Congresso Nacional tenha a oportunidade de avaliar, a partir de 2034, se vale a pena ou não manter as exceções à alíquota padrão da tributação sobre o consumo”.
O advogado e especialista em direito tributário Guilherme Di Ferreira avalia que as exceções podem ser benéficas, desde que os tratamentos diferenciados não fiquem concentrados apenas na União. Ele argumenta que as excepcionalidades beneficiam os setores incentivados.
“Agora, se essa oportunidade de exceções, tratamento diferenciado, seja delegada para cada município e estado, tudo bem, porque nós temos um país de dimensões continentais e por isso o que acontece no norte não acontece no sul, no oeste, no sudeste, então a gente tem muita diferenciação, por isso que é muito mais importante que essas decisões sejam tomadas pelos próprios municípios e estados”, afirma o especialista.
O estudo técnico foi enviado ao relator da reforma tributária (PEC 45/2019), senador Eduardo Braga (MDB-AM), nesta quinta-feira (28). O parlamentar avalia que “essa é uma opinião técnica avalizada, independente, que referenda dados, caminhos e sugere melhorIas no texto. Isso vai ser muito importante para a avaliação do Senado, agora que nós estamos na fase, a partir de hoje, da elaboração do relatório”.
O cronograma inicial apresentado pelo relator previa a votação do relatório na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) no próximo dia 4 de outubro. No entanto, Braga anunciou uma nova data. “Acredito que até o dia 20 de outubro consiga apresentar o texto na comissão”, disse o senador em uma rede social.
Desde que chegou ao Senado, no início de agosto após ser aprovada na Câmara, a reforma tributária — apontada por especialistas como fundamental para o crescimento econômico do país — recebeu 249 sugestões de emendas (até 28 de setembro). Apesar das emendas ao texto, o senador Márcio Bittar (União-AC) acredita que os senadores chegarão a um bom resultado.
“O que o Senado pode fazer com a liderança do Eduardo Braga como relator, ouvindo todo mundo, eu já presenciei reuniões dele com governadores, fazer um texto que chegue ao seu objetivo. Qual é o objetivo? É simplificação, simplificação traz economia e não aumentar a carga tributária. Eu não creio que o Congresso aprove nenhuma reforma que aumente a carga tributária do Brasil, que já é muito grande. Simplificação e economia.”
Quanto menos exceções menor será o IVA proposto pela reforma tributária, defendem especialistas
Reforma tributária
A reforma unifica os cinco principais impostos sobre o consumo de bens e serviços em um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) Dual. Na prática, são dois impostos. De um lado, IPI, PIS e Cofins (União) dão origem à Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Do outro, ICMS (estadual) e ISS (municipal) formam o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). A proposta tem como objetivo a simplificação do sistema tributário brasileiro — apontado pelo Banco Mundial como um dos piores do mundo — e mais transparência para o contribuinte.
IPVA
A proposta aprovada na Câmara prevê a possibilidade de uma tributação mais branda sobre a propriedade de veículos automotores em função do tipo, valor, utilização e impacto ambiental. Com o texto, o IPVA passa a incidir também sobre veículos aquáticos e aéreos, além dos terrestres já previstos na legislação atual. A mudança vai ao encontro do compromisso formalizado pelo Brasil no Acordo de Paris de reduzir em 37% suas emissões de gases de efeito estufa até 2025; e em 50% até 2030; além de atingir a neutralidade climática até 2050.
Imposto seletivo
A PEC 45 prevê a criação de um imposto seletivo que vai ser introduzido na regra geral de valor agregado com alíquotas maiores ou menores, considerando os impactos de determinado produto ou serviço na sociedade. Por exemplo, o cigarro, que é cientificamente apontado como nocivo à saúde, deve ter uma incidência de impostos mais elevada. A proposta acrescenta ao rol de competências da União instituir impostos sobre produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.