Cerca de 11 milhões de produtores rurais e empreendedores de pequeno porte do setor comercial e industrial poderiam economizar R$ 10,7 bilhões por ano se pudessem escolher livremente o fornecedor de energia no mercado livre. O dado faz parte do estudo “Portabilidade da conta de luz: impacto social e papel na transição energética justa”, elaborado pela Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel).
No setor rural, 4,5 milhões de unidades consumidoras de energia poderiam ter um desconto de R$ 2,8 bilhões ao ano na conta de luz. No segmento comercial, 6 milhões poderiam ter um abatimento de R$ 7,2 bilhões por ano. Além disso, mais de 411 mil pequenas indústrias poderiam ter uma redução de R$ 710 milhões anualmente.
Segundo o presidente-executivo da Abraceel, Rodrigo Ferreira, assim como os consumidores de energia de classe média, os produtores rurais e empreendedores de pequeno porte não se enquadram entre os grupos beneficiados por medidas que reduzem o custo da energia elétrica.
“O pequeno produtor rural está na mesma situação da classe média brasileira, preso em um mercado cativo sem ter direito à compra de energia no mercado concorrencial. Mais de 90% do comércio e da indústria do Brasil estão presos no ‘Brasil esquecido — naquele Brasil que não tem nenhuma política para redução do custo da energia, não tem acesso à [energia] solar e não tem acesso ao mercado livre.”
Atualmente, o modelo que dá liberdade de escolha do fornecedor de eletricidade só é permitido aos consumidores de grande porte. Com a abertura do mercado, qualquer consumidor poderá escolher de quem comprar energia, da mesma forma que escolhe a operadora de internet e telefonia.
“Evidentemente que permitir que esse consumidor possa comprar energia de qualquer fornecedor habilitado a vender, isso cria uma dinâmica concorrencial no mercado e, inevitavelmente, induz à redução de preços, beneficiando a geração de empregos, o reinvestimento e a indústria e o comércio do Brasil”, complementa.
Para Ivan Camargo, professor de engenharia elétrica da Universidade de Brasília (UnB), além dos benefícios econômicos, o mercado livre estimula a eficiência energética.
“Você tendo que concorrer com outros produtores de energia, você tem que fazer um produto com menos gasto e menor custo. Portanto, o impacto da economia como um todo é muito bom, no meu modo de ver, promovendo a competição entre os geradores de energia elétrica”, enfatiza
O professor Ivan Camargo destaca ainda que os preços no mercado livre são mais baratos devido a essa concorrência.
“Os vendedores de energia, tendo que concorrer para vender a sua energia, podem levar a um preço mais barato da energia. Isso vai beneficiar, por consequência, todos os consumidores.”
Classe média pode economizar R$ 22,7 bi ao ano com mercado livre de energia
Mercado livre pode baratear em até 10% a conta de energia dos consumidores mais pobres
20 anos de atraso
Ao longo dos anos, o Ministério de Minas e Energia reduziu os limites de carga para os consumidores comprarem no mercado livre. Atualmente, o valor mínimo para entrar nesse mercado é de 500 quilowatts (kW). Em 2024, o mercado livre estará disponível para todos os consumidores do grupo tarifário A, de média e alta tensão.
Segundo levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI), 56% das indústrias que estão no mercado regulado atualmente e que poderão migrar para o livre no próximo mês de janeiro manifestaram interesse em fazer essa mudança.
Apesar do avanço, essa barreira poderia ter sido eliminada há 20 anos, já que a lei 9.074 de 1995, estabeleceu — entre outras normas — que a União poderia promover a abertura completa do mercado de energia elétrica, 8 anos após a promulgação da lei. Ou seja, em julho de 2003.
“Isso não foi feito até hoje por falta de vontade política, porque em algumas gestões do Ministério de Minas e Energia não houve o entendimento completo das vantagens e benefícios disso para a sociedade”, avalia o presidente-executivo da Abraceel, Rodrigo Ferreira.
Para o vice-presidente de Estratégia e Comunicação da Abraceel, Bernardo Sicsú, esse atraso de 20 anos pode significar grandes perdas para a economia e competitividade do país.
“Em um cenário hipotético, se todos os consumidores tivessem o direito de escolher e decidissem optar por comprar no mercado livre de energia elétrica, a economia agregada seria de R$ 35,8 bilhões por ano, incluindo 5 milhões de residências de baixa renda. Ou seja, esse atraso retira a competitividade do país e prejudica o consumidor, que poderia se beneficiar com preços mais baixos e melhores serviços”.
A universalização do mercado livre de energia para consumidores de todos os perfis e porte é uma das propostas do projeto de lei 414/2021, que estabelece um novo marco legal para o setor elétrico. No dia 8 de julho, a presidência da Câmara dos Deputados autorizou a criação da comissão especial para analisar o projeto de lei, restando que os líderes partidários indiquem os membros dos partidos para esse colegiado, além da instalação da comissão, com eleição do presidente e designação do relator.