Por Murilo Aires – advogado
A falência é o instituto jurídico por meio do qual se afasta o devedor insolvente, empresário ou sociedade empresária, com os objetivos de preservar e otimizar a utilização produtiva dos bens, ativos e recursos produtivos da empresa, permitindo a liquidação célere das empresas inviáveis para a realocação eficiente de recursos na economia, fomentando, assim, o empreendedorismo.
Basicamente, a falência se dá por um processo judicial no qual é formado um concurso de credores: são arrecadados os bens da empresa falida; concomitantemente, são classificados os créditos que tem contra si; é liquidado o ativo arrecadado; e, por fim, são pagas as dívidas no limite do patrimônio liquidado. Trata-se de procedimento complexo na prática, contando com a atuação de um administrador judicial nomeado para a gestão da “massa falida”.
Historicamente, os processos de falência são reconhecidos por sua morosidade e inefetividade na satisfação do interesse dos credores: o trâmite judicial tende a ser demorado; a arrecadação dos bens da massa falida pode ser tumultuada; as massas falidas muitas vezes não têm bens suficientes ao pagamento das dívidas; os leilões públicos nem sempre encontram compradores etc. No Brasil, tais aspectos recorrentemente são objeto de reflexões, culminando em propostas legislativas.
A Lei nº 11.101/2005, lei brasileira vigente a respeito da matéria, foi recentemente reformada em vários de seus dispositivos pela Lei nº 14.112/2020. A matéria tomou novo destaque pela tramitação do Projeto de Lei nº 3/2024, aprovado pelo Plenário da Câmara dos Deputados em 26/03/2024, que agora segue para a sua tramitação no Senado.
Apesar de sua evolução no trâmite legislativo e o consenso a respeito da necessidade de melhorias no procedimento, a proposta vem sendo criticada por especialistas na área, sob o argumento de apresentar retrocessos, influenciar em grandes casos já relativamente estabilizados, além de alterar consideravelmente as circunstâncias de risco do mercado de crédito.
Entre os destaques está a estipulação de mandato de três anos para o administrador judicial nomeado pelo juiz, estando ele impedido de assumir mais de um processo com 100 mil salários mínimos ou mais até dois anos do término de seu mandato anterior perante o mesmo juízo.
Propõe-se também o estabelecimento de um limite de quatro falências por administrador judicial, estando ele ainda impedido de atuar em falência subsequente à recuperação judicial na qual atuou. Há, ademais, alterações nos limites de remuneração, com gradação regressiva de 2% a 5% a depender das faixas de valores estabelecidas. O projeto também prevê a possibilidade de eleição de um “gestor fiduciário” em substituição ao administrador judicial nas falências.
A tramitação repentina e em regime de urgência na Câmara dos Deputados surpreendeu a comunidade jurídica, bem como os agentes de mercado envolvidos, de modo que a tramitação no Senado estabelecerá novo palco de debates a respeito das modificações propostas.
*Murilo Aires é advogado do escritório Dosso Toledo Advogados, especialista em Insolvência Empresarial.