Sheyner Asfóra*
Paridade é a qualidade da igualdade. É o caminho a ser perseguido por todas e por todos para chegarmos, juntos, a plena efetividade do inciso I do artigo 5º da Constituição Federal que preceitua que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações” com o reforço constitucional de que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.
No Dia da Mulher Advogada, celebrado em 15 de dezembro, vale destacar a importância do debate amplo sobre a paridade de gênero no sistema de justiça e em todas as instituições democráticas brasileiras.
Paridade também passa por respeito e combate à violência. Ressalte-se que 80,6% das advogadas já passaram por algum tipo de preconceito no exercício da profissão em razão do seu gênero. Os dados são de um estudo conduzido pelo Grupo de Pesquisa CARMIm – Feminismo Jurídico, da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Alagoas, que ouviu advogadas de todos os estados. A pesquisa aponta, ainda, que em 90,4% dos casos, o preconceito/violência foi praticada por homens. Dentre os agressores, 65,2% eram advogados da parte adversa e 46% eram magistrados.
Os dados assustam e mostram que ainda estamos engatinhando quando o assunto é respeito e garantia de direitos para as mulheres advogadas e cultoras do Direito.
Apesar das grandes e estruturais desigualdades, o Brasil melhorou significativamente no ranking dos países com melhor paridade entre os gêneros, saindo da 94ª posição em 2022 para a de 57ª este ano, segundo o relatório Global Gender Gap, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial.
A história de discriminação com as mulheres vem de longe. Na Grécia antiga as mulheres não eram consideradas cidadãs. A revolução industrial transformou as donas de casa em operárias mas, apesar de desempenhar a mesma função dos homens, ganhavam bem menos. Nas duas grandes guerras mundiais, os homens foram para batalha e as mulheres tiveram que assumir os postos de trabalho para o sustento familiar.
Aqui no Brasil, a Constituição de 1824 não citava a mulher como participante da sociedade. Apenas em 1934, passados mais de 100 anos, a mulher começa a ganhar sua paridade com a definição de cidadania.
Em 2009, na busca da paridade e por mais incentivo e valorização da participação da mulher na política, tivemos avanços com a promulgação da Lei nº 12.034 ao estabelecer o número mínimo de 30% na representatividade de cada gênero nas candidaturas dentro de cada partido ou coligação.
No entanto, mesmo com essas mudanças, a paridade em cargos eletivos está longe de acontecer. O TSE Mulheres aponta que, entre 2016 e 2022, o Brasil teve, em média, 52% do eleitorado constituído por mulheres, 33% de candidaturas femininas e 15% de eleitas.
No âmbito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), foi aprovada no ano de 2020 pelo Conselho Federal da OAB, a Resolução 5/20 que alterou o Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB e estabeleceu a paridade de gênero (50%) e a política de cotas raciais para negros (pretos e pardos), no percentual de 30%, para as eleições da OAB em todo o território brasileiro. Um grande avanço.
No Judiciário, uma decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pela efetividade da equidade na magistratura brasileira, inaugurou uma política de alternância de gênero no preenchimento de vagas para a segunda instância. Com a decisão, as cortes deverão utilizar a lista exclusiva para mulheres, alternadamente, com a lista mista tradicional, nas promoções pelo critério do merecimento. A decisão alterou a Resolução 106/2010 do CNJ que trata dos critérios objetivos para a promoção de magistrados e de magistradas.
O ministro Luís Roberto Barroso, em sua posse como presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), evidenciou a importância da temática e defendeu em seu discurso que é preciso “aumentar a participação de mulheres nos tribunais, com critérios de promoção que levem em conta a paridade de gênero. E, também, ampliar a diversidade racial.”
Esse é um tema muito caro para todos nós dirigentes da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim) e sempre é pauta em nossas deliberações, nos projetos e em todas as ações voltadas à valorização da advogada e do advogado criminalista.
Essa a nossa busca e a nossa prática. Sim. A começar que a diretoria nacional da Abracrim é composta por 6 advogados e 6 advogadas, dividindo os cargos de forma igualitária.
É uma diretriz nacional e buscamos a sua efetivação, que em todas as diretorias estaduais sempre se observe a paridade de gênero e racial em suas composições, seguindo, é claro, o mesmo raciocínio nas composições das comissões nacionais e estaduais.
Assim tem sido. A busca da paridade é uma das bandeiras da Abracrim que, entre as suas comissões nacionais, tem a Abracrim Mulher que é formada por mulheres advogadas e que se destaca pelas iniciativas e muitas ações na valorização e fortalecimento das advogadas criminalistas.
Essa paridade defendida pela Abracrim e por todos nós, não é, tão somente, uma reparação histórica com as mulheres, mas é, antes de tudo, o nosso respeito e reconhecimento ao papel fundamental que a mulher cumpre na sociedade e no âmbito da Abracrim como atuante advogada criminalista. Temos essa consciência de que só dessa forma é que alcançaremos uma democracia plena.
Leonardo Boff certa vez disse que “todo ponto de vista é a vista de um ponto. Para entender como alguém lê, é necessário saber como são seus olhos e qual é a sua visão do mundo”. Ou seja, precisamos de diversidade em todos os espaços para que a sociedade seja representada como um todo. Para que os pontos de vista sejam diversos e para que a democracia seja cada vez mais democracia em sua forma plena como agasalhada pela Constituição Federal.
*Sheyner Asfóra é presidente nacional da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim)
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