Murilo Gurjão Silveira Aith*
No último dia 13 de dezembro, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, relator do Tema de nº. 1.102/STF (Revisão da Vida Toda), remeteu os autos – após seu pedido de destaque – à presidência da Suprema Corte para que o feito seja incluído na pauta de julgamento.
Hodiernamente, o ministro Luís Roberto Barroso é o presidente do Supremo Tribunal Federal e, naturalmente, o responsável por designar uma data para julgamentos em sessões presenciais.
Antes de prosseguirmos, é necessário, nesta oportunidade, elogiar a celeridade de toda a serventia do ministro Alexandre de Moraes, porquanto os autos sequer permaneceram uma quinzena em seu gabinete. Decerto, por estarmos diante de um grupo hipossuficiente/vulnerável, o ministro tratou o Tema com a seriedade merecida, atitude louvável e digna de menção.
Pois bem, como dito anteriormente, a responsabilidade de pautar o julgamento do tema em Plenário Físico é do atual presidente da Corte. Noutros termos, apenas o Ministro Barroso possui poderes para encerrar a angústia dos aposentados.
Embora tenha acompanhado o voto teratológico de Zanin e tenha adotado entendimento divergente no mérito do Tema, acreditamos que o ministro Barroso terá compaixão e pautar o julgamento logo no primeiro trimestre do ano de 2024.
Estamos saindo da seara técnica e adentrando, agora, em questões morais, relacionadas à dignidade/humanidade, aspectos que esperamos de Barroso. Afinal, um leitor assíduo de Aristóteles (como bem demonstra em seu Instagram pessoal) possui domínio suficiente sobre o certo e o errado.
Em “Ética a Nicômaco” (livro recomendado na suso mencionada rede social), Aristóteles define justiça como “uma espécie de meio-termo, porém não no mesmo sentido que as outras virtudes, e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediária, enquanto a injustiça se relaciona com os extremos. E justiça é aquilo em virtude do qual se diz que o homem justo pratica, por escolha própria, o que é justo, e que distribui, seja entre si mesmo e outro, seja entre dois outros, não de maneira a dar mais do que convém a si mesmo e menos ao seu próximo (e inversamente no relativo ao que não convém), mas de maneira a dar o que é igual de acordo com a proporção; e da mesma forma quando se trata de distribuir entre duas outras pessoas.”
Na mesma obra, conclui o filósofo que “a injustiça, por outro lado, guarda uma relação semelhante para com o injusto, que é excesso e deficiência, contrários à proporção, do útil ou do nocivo. Por esta razão a injustiça é excesso e deficiência, isto é, porque produz tais coisas — no nosso caso pessoal, excesso do que é útil por natureza e deficiência do que é nocivo, enquanto o caso de outras pessoas é equiparável de modo geral ao nosso, com a diferença de que a proporção pode ser violada num e noutro sentido. Na ação injusta, ter demasiado pouco é ser vítima de injustiça, e ter demais é agir injustamente.”
Nitidamente, Aristóteles, em 335 a.C., já descrevia com precisão a essência do voto de Zanin, um extremo completamente deficiente que, infelizmente, foi seguido pelo Ministro Barroso de forma cega e consciente.
Os aposentados não estão pleiteando nada além do que realmente lhes pertence e é de direito. Não à toa, o próprio Legislativo, no momento da criação das regras permanentes e de transição, garantiu aos aposentados o direito de optar pela regra mais favorável, sendo tal faculdade ratificada pelo STF no julgamento do Tema de nº 334 (direito ao melhor benefício) no ano de 2013, pelo STJ em 2019 (Tema de nº 999) e, novamente, pelo próprio STF no Tema de nº 1.102 (por duas vezes – em Plenário Virtual e Físico, no julgamento de mérito).
Pela 5ª vez – se contarmos desde o julgamento do Tema de nº 334/STF –, os aposentados estão sendo obrigados a assistir sua vitória no âmbito judicial, mas se submetendo aos riscos de um ministro recém-chegado (Zanin) prejudicar seus direitos por motivos “misteriosos”.
Com a devida vênia, é desarrazoado saber que a celeuma poderá se estender por mais tempo. O Tema completará 10 anos sob os cuidados do Judiciário e versa sobre as mais comezinhas regras do direito previdenciário.
Enquanto Zanin tumultua o bê-á-bá criando uma angústia e temor nas pessoas que buscam por seus direitos, aposentados falecem antes de obter uma melhoria não apenas legítima, mas também justa, em seus proventos. Acertadamente, não seria isso o que Aristóteles considera como justo.
O ministro Moraes não teria pedido destaque se Zanin não tivesse feito o que fez (induzindo, ainda, outros ministros ao erro), a lógica é simples. Os aposentados, em efeito cascata, dependem da equidade do ministro Barroso para que, finalmente, obtenham a formação da coisa julgada no Tema.
Esperamos que o ministro Barroso, no exercício de suas atribuições como Presidente da Corte, se conscientize de que o caminho proposto por Zanin é um verdadeiro retrocesso social, uma agressão à Constituição Federal e um desprezo aos direitos sociais. Inobstante, os aposentados contam com sua celeridade em designar uma data para a sessão presencial.
Impende relembrar que Barroso, ao ser empossado como Presidente do STF, jurou zelar pela segurança jurídica e combater a pobreza. Todos aguardam o cumprimento de sua promessa, inclusive, no Tema em questão.
Infelizmente estamos visualizando uma linha tênue entre a proteção da segurança jurídica e o caos no ordenamento. No momento em que direitos sociais cabais são subestimados, precedentes corrosivos maculam os pilares de toda a estrutura jurídica do país, contaminando, genuinamente, julgamentos presentes e futuros de todas as matérias.
O trabalho de diversos juristas segue árduo. Durante anos, incontáveis viagens foram realizadas, assim como despachos, reuniões, audiências, sustentações, artigos, participações/entrevistas para jornais, dentre inúmeros serviços e atividades inerentes ao bom andamento do Tema.
O trabalho em equipe resultou na aprovação de Enunciados favoráveis aos aposentados no CJF, diga-se de passagem.
A natureza da matéria atraiu renomados juristas em defesa dos aposentados, tais como: (I) Ministro aposentado Ayres Britto; (II) o prestigiado previdenciarista Fábio Zambitte; (III) o processualista Rennan Thamay; (IV) o constitucionalista Saul Tourinho e, por fim, (V) o renomado professor e economista Thomas Conti, além de diversos pós-doutores consagrados/validados no âmbito nacional.
Os ministros remanescentes não podem admitir que, agora em sede de embargos (recurso com elevado grau de restrição), o êxito dos aposentados – conquistado durante anos – seja invalidado por meio de fundamentos mirabolantes (cujo teor, inclusive, afronta o próprio Regimento Interno do STF). Além disso, seria uma verdadeira surpresa para o STJ receber novamente os autos, sendo que ficou claro, pela maioria dos Ministros, a inexistência de violação à Reserva de Plenário.
O voto de Moraes no último julgamento de mérito (com início em 25/02/2022), acompanhando o relator – com a maioria dos Ministros –, coerentemente aduziu: “O STJ conferindo interpretação teleológica a aludida disposição normativa, entendeu que deveria prevalecer a regra permanente do art. 29 da Lei 8.213/1991, quando esta fosse mais favorável ao segurado. Ou seja, procedeu à mera exegese da norma, sem a declaração de inconstitucionalidade seja da regra permanente, seja da regra de transição. Consequentemente, não haveria necessidade de declaração pela maioria absoluta dos membros do tribunal ou da Corte Especial, no caso do Superior Tribunal de Justiça. É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que não viola a reserva de Plenário a decisão que se limita a interpretar a legislação infraconstitucional, sem negar-lhe vigência”.
Haveria desordem homérica se o voto de Zanin prevalecesse na mais respeitada Corte do Judiciário, daí a razão do destaque.
A postura de Moraes revelou que ainda podemos confiar na proteção do STF. Com sabedoria, os Ministros seguem resguardando a higidez dos Temas sub judice, nos dando motivos para acreditar que o Presidente Barroso não retardará a inclusão do Tema no julgamento presencial.
*Murilo Gurjão Silveira Aith é advogado e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados
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