No ano passado, as exportações brasileiras rumo à União Europeia totalizaram US$ 50,9 bilhões, de acordo com o Comex Stat do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). Quase metade de tudo o que os europeus importaram do Brasil era de bens industriais. Por isso, a concretização do acordo de comércio entre o Mercosul e o bloco econômico europeu pode ser uma oportunidade para a retomada do protagonismo da indústria nacional, acredita Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior.
“O acordo serviria para a reindustrialização brasileira. O que a gente tem visto nos grandes acordos comerciais é a especialização produtiva, ou seja, empresas que acabam se especializando em determinados modelos e fases do processamento industrial. Isso poderia permitir uma integração muito positiva da indústria do Mercosul com a indústria europeia”, avalia.
Ao contrário da relação bilateral com a China, cuja pauta de exportações é essencialmente de bens agropecuários — no ano passado, apenas 22% dos itens vendidos aos asiáticos tiveram origem na indústria de transformação — , as trocas comerciais com os europeus têm maior participação da indústria, o que tende a se intensificar com a redução parcial ou total das alíquotas de importação sobre os produtos de maior valor agregado.
“O mercado europeu é um mercado premium, é um mercado que pode dar um acesso muito grande não só para as exportações agrícolas, mas também para as exportações industriais do Mercosul”, acredita Welber.
Levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) aponta que o acordo deve beneficiar cerca de 2.800 produtos industriais exportados pelo Brasil para os países europeus. Imediatamente após a parceria entrar em vigor, quatro em cada dez bens industriais brasileiros teriam as tarifas zeradas para acesso à União Europeia.
Segundo o senador Alessandro Vieira (MDB-SE), o acordo de livre comércio entre os dois blocos econômicos é uma boa oportunidade de a indústria brasileira ganhar espaço, embora acredite que o agronegócio continuará liderando a pauta de exportações. “Avançar na questão da industrialização — a própria reforma tributária que está em tramitação vai nesse sentido — é importante, mas o Brasil, provavelmente por longos anos, vai permanecer preso à essa sua vocação natural de grande fornecedor de commodities“, pontua.
Entraves
O acordo entre sul-americanos e europeus foi anunciado em junho de 2019, após duas décadas de negociações. O texto prevê que mais de 90% do comércio de produtos entre os países que fazem parte dos dois blocos terão os impostos de importação zerados em um intervalo de até 15 anos.
No entanto, 4 anos após o anúncio persistem alguns entraves para a consolidação formal do acordo. O primeiro deles tem relação com a pauta ambiental. Os europeus fizeram mais exigências ao Brasil e aos demais membros do Mercosul quanto ao combate ao desmatamento. Os sul-americanos veem o aditivo como uma tentativa de protecionismo aos produtores agrícolas da União Europeia.
Um outro ponto de discordância, lembra Alessandro Vieira, membro da Comissão de Relações Exteriores do Senado, refere-se à possibilidade de empresas europeias concorrerem com as nacionais pelas compras do governo federal.
“A demanda que foi acrescentada posteriormente ao último alinhamento, no sentido de acesso às compras públicas brasileiras, também gera certo desequilíbrio e, na minha opinião, não deve ser acatada. É um tipo de negociação que naturalmente é complexo e sujeito a idas e voltas”, diz.