O Livre Mercado, essa ideia de comércio sem barreiras, que promete integrar nações e promover uma concorrência justa, é frequentemente exaltado como a solução para o progresso econômico global. No entanto, a prática revela nuances bem menos idealistas. Um exemplo recente é o boicote francês às carnes do Mercosul, que expõe contradições entre o discurso e a realidade das relações comerciais internacionais.
No centro dessa controvérsia está o Carrefour e sua decisão de interromper a compra de carne do Mercosul em suas lojas na França, alegando o não cumprimento de “exigências e normas”. A justificativa oficial foi amplamente associada às pressões do setor agrícola francês, que enfrenta dificuldades econômicas. Esse episódio reaviva uma prática histórica da França: o uso do protecionismo econômico, seja por meio de subsídios generosos ou de barreiras comerciais, que frequentemente são criticadas em fóruns internacionais.
De um lado, o Brasil, maior exportador mundial de carne bovina, opera com padrões reconhecidos globalmente e um histórico de aumento significativo de produtividade e sustentabilidade. De outro, uma França que utiliza argumentos sanitários e ambientais para restringir o acesso a seu mercado, mesmo que esses mesmos produtos sejam aceitos em outros países europeus e em diferentes partes do mundo.
É importante observar que esse não é um comportamento novo. Desde a implementação da PAC (Política Agrícola Comum), que injetou bilhões de euros em subsídios ao setor agrícola, até as atuais barreiras comerciais disfarçadas de preocupações ambientais, a França preserva uma tradição de proteger seus mercados internos sob o pretexto de regulamentações mais rigorosas.
O caso do Carrefour também levanta outra questão: o papel das multinacionais em equilibrar demandas locais e princípios globais de operação. O CEO do grupo, Alexandre Bompard, se viu obrigado a se retratar diante das reações brasileiras, principalmente em função da JBS ter suspendido o abastecimento de carne vermelha, aproximadamente 80% do abastecimento, colocando em cheque a rede de supermercados. Na retratação o Bompard destacou que suas declarações não foram uma crítica à qualidade da carne brasileira. Ainda assim, o impacto inicial da decisão reforça as tensões entre Livre Mercado e protecionismo.
Embora as justificativas francesas destaquem preocupações legítimas com a sustentabilidade e a competitividade, é difícil ignorar que o protecionismo está em jogo. No fundo, trata-se de uma tentativa de mitigar os efeitos da concorrência mais eficiente que vem de fora. A França, assim, segue ajustando as regras do jogo a seu favor, enquanto prega a defesa do comércio global.
Ao Brasil, resta manter o compromisso com a excelência na produção e a busca por mercados que reconheçam essa qualidade. Este episódio serve de lembrete de que, embora o Livre Mercado seja uma ideia amplamente defendida, ele ainda está longe de ser aplicado de forma uniforme. É essencial que o Brasil continue evidenciando as inconsistências desse sistema e defendendo condições comerciais que sejam, de fato, equilibradas e respeitosas para todas as partes envolvidas.
*Marcos José Valle é bacharel em Ciências Econômicas, mestre em Educação, doutor em Sociologia. É professor no Centro Universitário Internacional – UNINTER, trabalha no Curso de Ciências Econômicas.
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JULIA CRISTINA ALVES ESTEVAM
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