A Argentina concedeu uma vitória contundente a Javier Milei, o candidato de extrema direita que surgiu como uma figura excêntrica em programas de televisão e que foi eleito em 2021 para deputado federal. A sua margem de mais de 11 pontos sobre o segundo colocado, o peronista e atual ministro da economia, Sérgio Massa, demonstra uma disposição de uma mudança radical por parte do eleitorado argentino. Este é o seu maior trunfo. E um dos poucos.
A situação econômica do país e a falta de recursos orçamentários é uma primeira dificuldade que o novo presidente enfrentará. A proposta de privatizar várias empresas públicas, inclusive a petroleira nacional YPF, apontam que o governo procurará levantar dinheiro para fortalecer o cofre do governo federal.
O segundo desafio será conseguir e formar e manter uma coalizão política para lhe garantir maioria no Congresso argentino. A sua coligação terá 39 (15%) das 257 cadeiras da Câmara e sete (9%) das 72 cadeiras do Senado. Além do mais, não elegeu nenhum governador. Para implementar mudanças legislativas, precisará emprestar o apoio da força da direita tradicional, denominada Juntos por El Cambio, liderada pelo ex-presidente Maurício Macri. Com isso, somaria mais 93 deputados federais e 24 senadores, além de 10 governadores provinciais. É um apoio considerável para um presidente com escassa experiência política e cujo partido é apenas uma etiqueta eleitoral e que não dispõe de capilaridade política nacional.
Entretanto, esse apoio não vem sem dificuldades e nem é de graça. Na Câmara, essa costura poderia chegar a 132 cadeiras, apenas um ponto acima do limiar de 50% das cadeiras. No Senado, a coalizão entre o La Libertad Avanza, de Milei, e o Juntos Por El Cambio, da direita tradicional, chegaria a 31 cadeiras, faltando ainda seis votos para aprovar uma lei com maioria absoluta. Nesta situação, teria que contar com votos de outras siglas, incluindo peronistas dissidentes. Os analistas argentinos avaliam que somente Macri ou os seus emissários seriam capazes dessa aglutinação. No médio prazo, a maioria de Milei no Congresso dependerá dos resultados positivos em política econômica, para atrair um apoio mais sólido.
A articulação com a direita tradicional já se desenha no arranjo para a montagem do governo. Patrícia Bullrich, candidata derrotada do Juntos Por El Cambio e de antiga família da elite argentina, ocupará o cargo de Ministra da Segurança. Na pasta da economia, o nome mais cotado é de Luis Caputo, um empresário do setor financeiro e ex-presidente do Banco Central. Ambos fizeram parte do governo de Maurício Macri (2015- 2019) e ajudam a entender que o novo governo terá participação central de setores de “la casta” (o establishment político) que Milei criticou furiosamente na construção de sua imagem.
Mais ou menos como o seu ministério, o governo de Milei oscilará entre duas personalidades. A primeira, que demoniza o Estado, com perfil histriônico de um candidato que afirma tomar conselhos com o seu cachorro falecido, Conan. E a segunda, de um candidato moderado que corteja e se aconselha com políticos tradicionais, como Maurício Macri. Para onde pender o humor de Milei nessa balança dependerá a estabilidade e continuidade do seu governo.
*Luiz Domingos Costa é professor de ciência política no Grupo Educacional Uninter.
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